terça-feira, 28 de setembro de 2010

Aterrissagem

Enquanto a vida me olha de muito longe
Solto no ar a nostalgia que me visita

Um vento frio me vem sorrindo
(rouba os meus sentidos)

Por um instante meus segredos
ficam suspensos na paisagem
e antes que eu possa guardá-los
aterrissam calados no horizonte

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ou isso ou isso

Risco (páginas em branco deste dia)

Penso (o risco)

Arrisco e decifro o que rabisco?

(ou é dor ou é dor)

Num outro dia pego isto que cisco

e transformo tudo em pó de poesia

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Lembranças

No quadro pintado por mãos infantis descubro um novo azul retratado e uma mancha de café

(o sinal da minha desordem me leva pra longe...)

Sinto saudades de um cigarro

e do volante de um carro

terça-feira, 14 de setembro de 2010

À sombra das moças em flor - Marcel Proust

... enquanto eu lhe expunha algo, conservava uma imobilidade fisionômica tão absoluta como se a gente estivesse falando diante de um busto antigo - e surdo - em uma gliptoteca.
Talvez por hábito profissional, talvez em virtude da tranquilidade que adquire todo homem importante a quem se pede conselho e que, sabendo que terá em mãos a direção da conversa, deixa o interlocutor se agitar, se esforçar, sofrer à vontade, talvez também para fazer valer os aspectos de sua cabeça (segundo ele grega, apesar das grandes suíças) ...

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Quem sabe?

Um dia
Mais um dia
Só um outro dia?

Quem sabe?

Talvez, hoje, um bom dia venha
e me ofereça suas mãos leves
para uma dança de alegria

Quem sabe...

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Ovelha

Ainda ocupado, Senhor?
Ouça, há sangue neste silêncio
Recolhe este momento
Que é imenso e abraça a dor

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Minha História - Chico Buarque

Ele vinha sem muita conversa, sem muito explicar
Eu só sei que falava e cheirava e gostava de mar
Sei que tinha tatuagem no braço e dourado no dente
E minha mãe se entregou a esse homem perdidamente

Ele assim como veio partiu não se sabe pra onde
E deixou minha mãe com o olhar cada dia mais longe
Esperando, parada, pregada na pedra do porto
Com seu único velho vestido cada dia mais curto

Quando enfim eu nasci minha mãe embrulhou-me num manto
Me vestiu como se fosse assim uma espécie de santo
Mas por não se lembrar de acalantos, a pobre mulher
Me ninava cantando cantigas de cabaré

Minha mãe não tardou a alertar toda a vizinhança
A mostrar que ali estava bem mais que uma simples criança
E não sei bem se por ironia ou se por amor
Resolveu me chamar com o nome do Nosso Senhor

Minha história é esse nome que ainda hoje carrego comigo
Quando vou bar em bar, viro a mesa, berro, bebo e brigo
Os ladrões e as amantes, meus colegas de copo e de cruz
Me conhecem só pelo meu nome Menino Jesus